2021 E OS ENTENDIMENTOS DA RECEITA FEDERAL

Neste ano de 2021, a Coordenação Geral de Tributação – COSIT, exarou inúmeras soluções de consulta de contribuintes, algumas delas mantendo entendimentos, a nosso ver, equivocados, bem como, outras, trazendo algum alento aos contribuintes.

Assim, selecionamos algumas merecedoras de destaque, seja pelos aspectos negativos ou positivos. Vamos a elas.

1. Incentivos Fiscais Relativos ao ICMS

Como já tivemos a oportunidade de comentar no passado, a não incidência do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido (CSLL) sobre o montante correspondente aos créditos presumidos do ICMS apropriados em razão de benefícios fiscais concedidos por diversos Estados, é matéria já pacificada pelos nossos Tribunais, bem como objeto de disposição legal expressa.

Ocorre, porém, que a RFB, sob o argumento de que os créditos presumidos não se caracterizavam como subvenções de investimento e, nessa medida, representavam efetiva receita tributável, passou a autuar os contribuintes que não incluíam o valor desses incentivos nas bases de cálculo do IRPJ e da CSLL.

Diante das inúmeras discussões judiciais travadas em razão dessas autuações, o Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido do descabimento da exigência dos tributos federais sobre os referidos créditos presumidos, sob os seguintes fundamentos:

i) quanto ao IRPJ/CSLL: A inclusão dos créditos presumidos na base de cálculo desses tributos representa interferência da União na política adotada pelos Estados, ofendendo o princípio federativo e a segurança jurídica e, o valor a eles correspondente não caracteriza lucro; e, 

ii) quanto às contribuições PIS/COFINS: Afastou-se também a incidência dessas contribuições aplicando-se aos créditos presumidos a mesma lógica adotada na decisão do RE 574.706/PR do STF, ou seja, os créditos presumidos não caracterizam receita passível de inserir nas respectivas bases de cálculo. 

Importante salientar que o entendimento firmado pelo STJ não estabelece qualquer ressalva quanto à natureza de tais créditos – se caracterizam subvenções para investimento ou subvenções de custeio, considerando todo e qualquer crédito presumido como alheio às bases de cálculo dos tributos federais.

Cabe, ainda, lembrar que o STF considerou essa discussão de natureza infraconstitucional, razão pela qual não mereceu a apreciação desse Tribunal.

Posteriormente, a Lei Complementar nº 160/17, acrescentou o §4º ao art. 30 da Lei nº 12.973/2014 que dispõe expressamente que todos os benefícios econômico-fiscais relativos ao ICMS “são considerados subvenções para investimento, vedada a exigência de outros requisitos ou condições não previstos”.

Diante do entendimento firmado pelo STJ e da absoluta clareza da Lei Complementar nº 160/17, não há espaço para dúvidas quanto à impossibilidade de inclusão do montante correspondente aos créditos presumidos de ICMS nas baseS de cálculo dos tributos federais incidentes sobre as receitas (contribuições PIS e COFINS) e sobre o lucro (IRPJ e CSLL).

Não obstante, a RFB insiste em criar insegurança jurídica para os contribuintes beneficiários de incentivos de ICMS.

É o que se verifica da Solução de Consulta COSIT nº 99011 de 14 de dezembro último, no sentido de que os benefícios fiscais ou econômico-fiscais relativos ao ICMS somente podem ser excluídos das bases de cálculo das Contribuições ao PIS e da COFINS desde que os referidos incentivos tenham sido concedidos a título de estímulo à implantação ou expansão de empreendimento econômico.

Bom lembrar que esta Solução de Consulta reproduz o entendimento já exarado na Solução de Consulta COSIT nº 145 de 15 de dezembro de 2020 que dispõe sobre a obrigatoriedade de inclusão desses créditos presumidos nas bases de cálculo do IRPJ e da CSLL.

Portanto, consagrada está a insegurança jurídica que empurrará os contribuintes para novas discussões judiciais, tornando os investimentos no Brasil cada vez mais onerosos.

2. Momento do Reconhecimento dos Direitos Creditórios Assegurados por Medida Judicial

Considerando que o pagamento de precatórios em demandas de natureza tributária é sempre incerto em razão de seus constantes adiamentos, os contribuintes optam por requerer judicialmente a compensação dos valores de tributos indevidamente pagos.

Portanto, é usual o ingresso com mandados de segurança sem a estipulação prévia dos valores indevidamente pagos que serão apurados somente após o trânsito em julgado de sentença favorável ao contribuinte.

No que toca ao momento em que o contribuinte deve reconhecer contabilmente o seu direito creditório e, por consequência, oferecer o valor correspondente à tributação pelo IRPJ e pela CSLL, a Solução de Divergência nº 19/2003 determinava que tal reconhecimento passava a ser obrigatório no período em que verificado o trânsito em julgado da decisão judicial (momento em que a decisão torna-se definitiva).

Todavia, a premissa que sustentava essa manifestação partia do equivocado pressuposto de que “a sentença que declara o direito à compensação se constitui em título líquido e certo”, o que não ocorre em sede de mandado de segurança em que se requer a compensação de um valor a ser quantificado na esfera administrativa.

Felizmente, este entendimento foi revisto na Solução de Consulta COSIT nº 183 de 07 de dezembro de 2021.

Nesta nova manifestação, a RFB estabelece que, na hipótese de decisões judiciais transitadas em julgado nas quais em nenhuma fase do processo foram definidos valores pelo juízo, o valor do direito creditório deve ocorrer no momento da entrega da primeira Declaração de Compensação.

Diante dessa manifestação, fica afastada a possibilidade de autuações em razão do não oferecimento do valor desses direitos creditórios concomitantemente com o trânsito em julgado da decisão judicial.

3. Venda de Imóvel e Tributação do Ganho de Capital

Segundo disposto no § 14 do art. 215 da Instrução Normativa RFB nº 1700/2017, deve ser acrescido ao lucro presumida o ganho de capital auferido na alienação de imóveis classificados como ativo não circulante (ativo imobilizado), ainda que reclassificados para o ativo circulante.

Nos termos desse dispositivo, ainda que a empresa intencione vender um imóvel de seu uso ou originalmente destinado à locação e, em observância das normas contábeis, o reclassifique para o ativo circulante, não poderá tributá-lo com base no lucro presumido, ou seja, não poderá oferecer à tributação pelo IRPJ e pela CSLL somente o percentual de presunção de lucro (de 8% da receita de venda para o IRPJ e de 12% da receita de venda para a CSLL).

Vale dizer que a totalidade da diferença entre o valor contábil e o preço de venda será tributada como lucro da operação.

Na prática, tal disposição implicaria num sensível aumento da carga tributária na hipótese do imóvel objeto da venda houvesse sido adquirido há muito tempo ou estivesse integralmente depreciado – caso em que o ganho de capital é elevadíssimo.

Para efeito de comparação, esse ganho de capital integralmente oferecido à tributação fica sujeito a uma carga tributária aproximada correspondente ao IRPJ e à CSLL é de 34%. Já na hipótese de aplicar-se a presunção de lucro para a venda de imóveis a carga tributária aproximada para esses tributos é de 3,08%.

Todavia, por meio da Solução de Consulta nº 7 de 04 de março de 2021, a COSIT manifestou o entendimento segundo o qual, desde que a pessoa jurídica optante pelo lucro presumido para cálculo do IRPJ e da CSLL tenha por objeto social também a atividade de venda de imóveis, poderá tributar a receita da venda de um imóvel com base na presunção de lucro, ainda que tal imóvel tenha sido utilizado anteriormente para locação.

Importante salientar que a tributação com base na presunção de lucro (usualmente muito menos onerosa) independe do imóvel ter ou não sido reclassificado do ativo não circulante para o ativo circulante.

Em suma, segundo essa orientação, somente devem acrescer o ganho de capital ao lucro presumido para efeito de tributação (carga tributária aproximada de 34%), as pessoas jurídicas que não tenham por atividade prevista em seu objeto social a compra e venda de imóveis.

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Roberto Cunha